domingo, 27 de março de 2022

Amor em preto & branco.

 


“Na verdade, embaixo da pele, todo mundo é vermelho!”

Mas vamos deixar essa questão para mais adiante, vamos ver o comecinho de nossa história conhecendo uma família do interior do Brasil.

Lá, distante da capital, nasceu Nate, o apelido de Natália, filha única de Rosa e neta de dona Arminda.

Rosa nunca contou para niguém quem era o pai de Nate. O que se sabe é que ela era namoradeira, mas se apaixonou por um rapaz que nunca se deixou ver com ele.

Nascida Nate, Rosa deixou o encargo maior de criar a menina para sua mãe e saía para trabalhar.

Depois de ter a filha, nunca mais quis namorar. Cobriu-se de desgosto e depois do trabalho encontrava-se com alguns amigos na vendinha perto de casa para desopilar tomando uma cerveja.

Com o tempo esse hábito foi se tornando parte de sua rotina e a bebida virou conforto para os dias tristes, celebração para os dias alegres, remédio para quando estava doente... enfim, tornou-se parte principal de sua vida.

Dona Arminda reclamava, aconselhava e falava o quanto Nate precisava dela. Já estava crescida e se envergonhava ao ver a mãe trocando as pernas ao andar.

Nate era muito inteligente e dona Arminda a incentivava a estudar para ter uma profissão e uma vida diferente daquela em que viviam.

Os conselhos não foram em vão. Nate seguiu a cartilha da avó e se preparou para ser sempre a melhor da classe.

Aqui começa a nova vida de Nate, quando foi convidada para se inscrever em uma faculdade nos Estados Unidos.

Conseguiu êxito e apoio dos professores e amigos que cativara desde que mudou-se para a capital para estudar, tudo com ajuda de sua avó, através de suas patroas, para quem fazia faxina.

Chegou o dia de sua viagem, iria conhecer um mundo novo, diferente, sabido só através dos livros e filmes que tanto gostava.

Agora já no avião, sua mente passeava entre as mais remotas lembranças com sua mãe presente e ao mesmo tempo distante; sua avó cheia de sabedoria e proteção...

E agora, como seria sua vida? Teria amigos? Amores?

Dormiu. Acordou já no país do Tio Sam.

Na nova terra o frio do começo de outono lhe despertou. Sentiu também um frio na barriga, mais forte de que todas as outras vezes que enfrentara novas situações.

Quando chegou no Campus da Universidade teve a sorte de dividir o alojamento com outras  três garotas que se identificaram de imediato.

Ponto para sorte de Nate. Começou a sentir-se mais à vontade e em poucos dias eram um grupo animado e divertido.

A noite estudavam na biblioteca e fugiam um pouco para a cafeteria.

− Olha lá, Nate, aquele bonitão está olhando para você! – Apontou  Rebecca.

− Para mim? Imagina!

− Sonsa!! Disseram todas rindo muito.

Os encontros “casuais” ficaram frequentes e Nate já sentia falta da presença do “bonitão” quando ele não aparecia.

Seu nome era Joe, aluno do 4˚ ano do mesmo curso em que a Nate estava começando.

Como ficamos sabendo? A chefe do  Grupo, Alícia, que era o capeta em figura de gente, se encarregou de descobrir a vida inteira do rapaz.

Mandaram um torpedo para o tímido Joe em nome de Nate o convidando para o aniversário imaginário de uma delas, e outro torpedo para Nate a convidando para o aniversário de Joe.

Plano perfeito? Parece que sim. Funcionou para o encontro, e as boas gargalhadas dos enganados e o início de um namoro cheio de paixão.

Tudo que todo mundo quer.

Passaram-se alguns meses e Joe começou a falar de Nate para a familia. Queria que eles a conhecessem.

Eles moravam em um estado não muito longe e começavam a planejar o encontro com Nate, que a chamavam de “a brasileira.”

— E a brasileira, Joe? Como vocês estão indo? – Perguntava a mãe.

— Está bem e feliz, mãe. Sempre manda recomendações a todos.

— Mande o mesmo, querido e nos mande uma foto dela, imaginamos que seja muito bonita. As brasileiras são bonitas, alegres, muito mais bonitas de que essas branquelas americanas sem sal.

Joe tentava sair logo da conversa. Como diria para a mãe que Nate era bonita sim, mas era branca, tão branca quanto as americanas?

Por isso evitava mandar qualquer foto dela ou alongar o assunto. Conhecia sua mãe e o quanto ela era radical e orgulhosa em ser afrodescendente, jamais aceitaria uma pessoa branca na família.

Joe apostava no carisma de Nate e contava como certa a aceitação dela na família dele.

Cada dia os dois, Nate e Joe, ficavam mais apaixonados e começavam a fazer planos.

Era um casal feliz e não se incomodavam com o fato de raça ou cor. Para eles, o amor não tinha cor específica, mais ainda: o amor não precisa de cores para ser radiante e forte.

Tinham uma grande afinidade, um objetivo e a vontade de ficarem juntos. Isso era o suficiente.

Chegou um feriado e eles encontraram a oportunidade de ficarem uns dias com a família de Joe. Seria a oportunidade para Nate encantar a todos como o encantou − pensou ele.

Não contou para Nate o modo de pensar de sua família e da maioria dos grupos afrodescendentes nos Estados Unidos.

Pouco falavam sobre coisas que para eles não tinha importância, ou não fazia diferença como era o caso do preconceito velado por parte dos brancos e aberto por parte das pessoas afrodescendentes.

Em uma tarde quente de quase final de primavera, o casal chegou para o ansiado encontro.

Entraram e Joe foi logo gritando por sua mãe: — Mãe, venha aqui! Depressa antes que a brasileira se arrependa e vá embora – Brincou ele.

A mãe veio no mesmo tom de alegria do filho: segura ela aí, filho, estou indo!

Dona Evelyn vinha quase correndo e parou de uma vez quando viu os dois, filho e futura nora de mãos dadas em sua sala.

Ficou em choque. Fechou a cara e chamou Joe para outra sala deixando Nate sem saber o que estava errado.

Segundos depois, Nate descobriu o que estava acontecendo quando ouviu a voz alterada de dona Evelyn perguntando ao filho: — Que raios te fizeram trazer esse lixo branco aqui para dentro de casa?

— Calma, mãe, vamos conversar. Fale mais baixo que ela pode ouvir.

— Quem se importa? Respondeu a mãe muito brava.

— Mãe, a gente está junto e é para valer. Ela pouco se importa com essa coisa de cor ou raça e eu, menos ainda.

— Mas eu me importo! – disse dona Evelyn. − E se você quer ficar junto com ela, que fique, a escolha é sua. Mas saiba que você morre para mim e eu para você.

— Mãe, veja que situação você me coloca. Seja razoável – implorou Joe.

— Escute aqui, senhor Joe, pense e faça sua escolha. Leve essa pessoa daqui. Te dou uma hora para você resolver com quem você escolhe ficar: com sua família ou com ela.

Joe Sabia que a mãe estava falando sério. Saiu levando Nate e tentando explicar o que não tinha explicação e nem sentindo para ela.

Ele lhe disse que precisa conversar com a mãe, acalmá-la e que a deixaria em um hotel e voltaria em seguida.

Nate, desapontada, cheia de questionamentos, com a vida inteira passando em sua frente, ligou para a amiga Rebecca pedindo que lhe mandasse dinheiro para ela ir embora.

— Quando eu chegar te conto, amiga. Só preciso desse favor agora porque como você sabe não tenho nem onde cair morta.

— Calma, amiga. Procure um lugar onde tenha possa receber um envio rápido de dinheiro e te mando o dinheiro agora.

O grupo fez uma reunião de amigas em caráter de urgência.

Precisavam fortalecer a Nate, dar apoio, interferir, fazer qualquer coisa para eles não se separarem.

Horas depois, Nate chegou no alojamento e tentou explicar a situação para suas amigas.

Ela não parava de chorar e repetia que não entendia a atitude da mãe de Joe e muito menos a do próprio Joe, que deveria estar ainda na casa de sua mãe; ter tido uma conversa e a deixado falar com ela.

Mais tarde, Joe chegou e tentou conversar com Nate que não queria conversar naquele momento. Precisava pensar, digerir o ocorrido.

O grupo amigo entrou em ação e conseguiu contornar tudo explicando para Nate um pouco mais dos motivos de dona Evelyn e a importância para os dois se unirem agora em nome do que sentiam.

Joe contou para Nate que não concordava com a mãe mas compreendia suas dores. Que havia dito para ela que não tinha como escolher entre ela e Nate.

Mas preferia viver esse amor, e que estaria sempre ali para ela, sua mãe.

O tempo passou e dona Evelyn não arredou o pé da decisão de não querer mais contato com o filho.

Não atendia suas chamadas, bloqueou os contatos digitais e devolvia as cartas que Joe enviava numa tentativa de alcançá-la.

Chegou o dia de sua formatura e Joe mandou o convite para a mãe,  que logo devolveu.

Joe e Nate casaram e mandaram o convite para  dona Evelyn que prontamente também devolveu.

Eles estavam felizes, mas a alegria não era completa. Joe sentia falta da família, e Nate sentia falta de ter uma família e desejava muito se unir à família de seu amado.

Nasceu o primeiro bebê de Joe e Nate.

Eles então, mandaram a foto do bebê para dona Evelyn. Notando que em todas as outras tentativas ela não se dera ao trabalho sequer de abrir o envelope, Joe escreveu por fora em letras garrafais:

MÃE, NOSSO CORAÇÃO ESTÁ ABERTO. DENTRO DESTE ENVELOPE ESTÁ A FOTO DE SUA PRIMEIRA NETA, EVELYN, EM SUA HOMENAGEM. TE AMAMOS!

Dona Evelyn recebeu o envelope como recebia toda a correspondência do filho, e como das outras vezes a devolveu.

A diferença é que desta vez ela foi devolver em pessoa.

Nate a recebeu com um abraço e dona Evelyn correu para abraçar sua neta, de sangue vermelho, assim como o dela.

Percebeu que quando queremos, a vida tem a cor branca, que representa a paz e a cor preta que representa a força acima de todas as cores.

"... nem tudo na vida precisa ser colorido, basta ser em preto e branco. Simples assim!" [ Lenilson Xavier]

15 comentários:

Vida disse...

Que história extraordinária!
O importante é que o amor venceu o preconceito.

dinah disse...

Cor é apenas um pigmento da pele. Não faz ninguém melhor ou pior

Lea disse...

O amor não precisa de cor, precisa de intensidade.
No fim das contas, como diz o começo da história:
embaixo da pele todos nos somos vermelhos!

elkepoetisa@gmail.com disse...

Linda história !!!!

adilsoncentury21 disse...

Belo Blog parabéns!

Anônimo disse...

Muito bem .. sempre uso isso como
Referências.. raça existe uma a humana..
Etinias várias
Mas o amor sempre prevalece
Sobre todos
Pois somos apenas humanos
Aprendendo a viver..
Parabéns... Poeta escritor...
Parabéns...

Eduardo Chiarini disse...

Mais uma vez uma história extraordinariamente bela e profunda.
Desde a vitória pessoal de Nate, estudando e indo morar no país de seus sonhos, até a vitória do amor, que sempre prevalece sobre qualquer tipo de intolerância.
Parabéns ao pessoal do blog que sempre nos contempla com essas historias magnificas.

Tobias disse...

Como sempre, lindíssimo!
E ficamos feliz em saber que o amor se supera contra qualquer seja a cor, raça ou etnia. Parabéns.

Ana Vilarejo disse...

Que linda e edificante história poeta

Expressou com clareza à virtude do amor.
Parabéns!

Alex disse...

In the face of impossible choices, the only road to take is the where your heart leads...That Joe was brave enough to take that road is amazing! Because it didn't end with choosing to love Nate...the road he chose kept his heart open and hope alive...and no wonder, a miracle happened. So glad that Ms. Evelyn could see past herself, past her fears. I do love a happy ending! ;-)

Diana Scarpine disse...

Lindo texto! Parabéns!
Abraço,
Diana Scarpine.

Cecilia disse...

O Amor é de todas as cores. Joe e Nate souberam colorir esse sentimento tão lindo. Amei o casal.

Rochela disse...

Joe e Nate não tiveram medo nem recuaram e salvaram o amor
deles. Me emocionei com o final. Parabéns ao blog!

Navena disse...

Bonita história de amor de Nate e Joe, vencendo os obstaculos
impostos pelo ignorância. Melhor lição no entanto foi da Sra. Evelyn,
que deixou de olhar como os outros a olham, para olhar para o que é mais importante: a pessoa. Nesse momento ganha o prório respeito. Mando meu agradecimento e meu amor para o pessoal do blog por dividir conosco essa história tão especial.

Observadores e atores da vida. disse...

Cinco Cantos agradece a visita e a opinião de Vida, Dinah, Lea, Elke, adilsoncentury21,Anônino, Eduardo, Tobias, Ana, Alex, Diana, Cecilia, Rochela e Navena.
Joe e Nate souberam amar e ao final a Sra.Evelyn também. Como disse Navena "vencendo obstáculos impostos pela ignorância".
Lembramos que as historias são reais e já temos outra publicada.

Cinco Cantos thanks Vida, Dinah, Lea, Elke, adilsoncentury21, Anônino, Eduardo, Tobias, Ana, Alex, Diana, Cecilia, Rochela and Navena for visiting and for their opinion.
Joe and Nate knew how to love and in the end Mrs. Evelyn too. As Navena said "overcoming obstacles imposed by ignorance".
We remind you that the stories are real and we already have another one published.

Paixao.com

    “ Conheci um amor virtual, amor tão lindo quanto o real, sempre mando recados e depoimentos, mesmo distante tocou meus sentimentos.” ...