Cada um é, para aquilo que nasce, diz o ditado. Mas,
cada um precisa lutar para ser o que é.
Assim, quando o mundo chegar à sua rotação total, você
poderá descer sem susto, na certeza de uma escolha acertada e digna.
Porque o mundo... ah, o mundo... esse é redondo e gira
para todos, assim como girou para os donos de nossa história.
Numa cidade pequena do interior, alguém toca a
campainha de uma casa de apoio à crianças desamparadas.
Vera, uma senhora bondosa e criadora da instituição
que se mantinha com doações de pessoas e instituições, vai até o portão.
À primeira vista não tinha ninguém, mas olhando para
baixo viu uma figurinha pequena e franzina sentada na porta com um papel na
mão.
Vera se apressou em pegar a criança mal agasalhada e a
abraçar protegendo-a do frio que fazia naquela noite.
Entrou correndo e pegou o papel que a criança, uma
menina, segurava.
Leu em voz alta: − Meu nome é Eliane e tenho dois anos
de idade. O meu aniversário é dia 1º de dezembro.
Vera habituada com situações assim, logo cuidou de
Eliane, deixando-a confortável, já que parecia assustada.
No dia seguinte, fez as comunicações de praxe às
autoridades da cidade e assumiu a responsabilidade de acolhê-la, fazendo
todos os registros de sua chegada como sempre fazia.
Não levou muito tempo e a pequena recém chegada se
adaptou à nova vida e à nova moradia.
Todas os meses, ficava na fila de apresentação às
famílias interessadas na adoção.
Algumas das crianças encontravam novas famílias e
saiam; outras perdiam as suas e chegavam.
Esse era o cotidiano da Casa de Apoio Santa Maria,
conhecida como a Casa da Dona Vera.
Os mais velhos ajudavam com os menores e vida que
segue.
O tempo passava e Eliane não conseguia uma família para adotá-la.
Devido a idade era mais difícil despertar interesse.
Era notadamente inteligente e quieta. Parecia sempre
estar pensando, olhando, observando e guardando.
Eliane já estava com sete anos de idade e continuava
na casa.
Nesse ano, dona Vera recebeu a visita de uma senhora
da capital com sua filha.
A mãe conversou muito com dona Vera, e contou que na
verdade não tinha interesse em adoção, mas gostaria de cuidar de uma menina que
fosse da idade da sua filha, para lhe fazer companhia.
Sendo a menina de sete anos, Vera logo pensou em
Eliane e a chamou para conhecer Clara, a filha da senhora que acabara de
conversar.
A boa conexão entre Eliane e Clara foi
imediata. Em poucos minutos já estava Eliane mostrando a casa e os brinquedos
comunitários, orgulhosa e feliz como nunca estivera.
Feitos os acordos, Eliane foi levada para a nova casa.
A recepção que Clara fez à Eliane, não foi menor do
que a recebida por ela quando esteve na Casa de Apoio.
Eliane dormia com uma das empregadas da casa mas,
Clara sempre dava um jeito de convencer os pais a deixarem Eliane dormir com
ela em seu quarto.
Clara era uma menina delicada, gentil e doente. Motivo
pelo qual não frequentava a escola normalmente, como as outras crianças.
Tinha professores particulares que vinham até sua
casa, incluindo uma professora de piano e inglês.
Talvez devido à doença que a deixava fragilizada,
odiava estudar, puxando assim Eliane para assistir às aulas com ela e cumprir
as tarefas em seu lugar.
Faziam isso no instinto de brincadeira, era um segredo
das duas e se divertiam assim.
Eliane e Clara se tornaram mais do que amigas,
era um laço de irmandade e cumplicidade. Uma completava a outra e eram
confidentes.
Passados seis anos, a doença de Clara se agravou e aos
treze anos de idade deixou Eliane sozinha, triste e desolada.
Não menos desolados ficaram os pais de Clara e sua
avó, uma vez que era filha única.
Agora restava saber o que fazer com Eliane.
Decidiram que a agora adolescente ficaria, e que lhe
ensinassem os serviços da casa, assim trabalharia como ajudante nos
afazeres domésticos da imensa casa, agora vazia sem a presença de Clara.
A decisão foi tomada contrariando a avó de Clara, que
não aceitava Eliane saudável e sua Clara levada por uma enfermidade.
Dona Emília, como se chamava a avó de Clara,
transferiu seu desgosto e raiva para Eliane.
Nada que a garota fizesse a agradava. Implicava e lhe
tirou tudo que a Clara lhe dera.
As roupas que lhe dava eram roupas usadas dos adultos,
fazendo com que Eliane usasse a criatividade para adaptá-las ao seu tamanho.
Não queria que frequentasse a escola pública onde
estudava, dizia que não confiava na “sonsice” dela.
— Vai deixar essa moleca sair? Qualquer hora aparece
aqui com a barriga maior que a petulância. Essa garota não presta! – Falava.
—Deixe ela, mãe, logo fará dezoito anos e vai procurar
a vida dela – dizia a filha.
E Eliane chegou aos seus dezoito anos. Foi avisada que
deveria procurar um lugar, porque não podiam mais assumir a responsabilidade
com ela.
Deram-lhe um tempo, que Eliane, orgulhosa como
aprendera ser, não aceitou.
O tempo passado ao lado de Clara não foi apenas
divertimento, foi preparatório. Aproveitou a oportunidade que Clara, brincando
lhe dera.
Era fluente em inglês e tinha um nivel cultural de dar
inveja.
Conseguiu um trabalho e dividia o apartamento com
outras três moças para economizar dinheiro.
Se dedicou a estudar e pelas boas notas conseguiu uma
bolsa de estudos para a universidade.
Estudava durante o dia e à noite dava aulas de piano,
pois teve que deixar o outro emprego.
Nos fins de semana estudava desesperadamente
para ter boas notas e manter a bolsa de estudos.
Não era fácil, mas tinha um objetivo, o mesmo
confidenciado à sua amiga e irmã Clara.
Dizia que seria médica para tratar da amiga e as duas se abraçavam cheias de esperanças.
Do passado na Casa de Apoio, Eliane só tinha um
envelope pardo com sua história que só abriu no dia de sua formatura no curso
de medicina.
Da casa da família de Clara, tinha a lição que a única
coisa que ninguém pode lhe tirar é o que você aprende.
De Clara, tinha as melhores lembranças e a base
fundamental para chegar onde estava chegando.
A ela, só lhe faltava o futuro que estava chegando com
as melhores promessas.
Tempos depois, já médica cumprindo sua residência na
especialidade que escolhera, foi chamada para atender um paciente.
À sua frente, dona Emília num estágio avançado de uma
doença que que lhe tirava o direito de morrer dignamente.
Diante de uma escolha dessas que a vida nos impõe,
Eliane tomou o caso para si, e em memória à Clara, cuidou pessoalmente de sua
avó, com o mesmo carinho que cuidaria de Clara.
Rodeada da família, e com a dignidade que todos
merecem, dona Emília morreu segurando a mão de Eliane, mas não foi antes lhe
dizer:
“Doutora... doutora Eliane, você é uma menina de
valor!”
“Assim, quando o mundo chegar à sua rotação total,
Eliane poderá descer sem susto, na certeza de ter feito uma escolha acertada e
digna.”
Mundo Redondo!
15 comentários:
Gostei muito da lição aprendida na casa dos pais da Clara: "a unica coisa que ninguém tira de você é o que você aprende"
História linda!
Que impactante!
De uma situação prazerosa e difícil ela resolveu fazer o bem.
Muito bacana e comovente,história.
A belíssima lição que fica na rotatória do mundo, a vida lhe indica o caminho. Você só precisa saber ler a placa de sua direção a seguir.
Parabéns! Belíssima!
Muito emocionante. A vida ensina e cobra.
Como de costume, uma história cheia de significados, de lições, de superação e coragem.
Parabéns à Eliane, a doutora, com o coração cheio de amor.
Parabéns ao pessoal do Blog.
Tudo tem um propósito. Envolvente conto.
Olá... Como sempre histórias envolventes, com fundamento, muito gostoso de ler, parabéns e espero que qaundo realmente o mundo parar de girar, estejamos todos seguros...
I am always so inspired by people who can fight their adversity to reach the dream that burns bright in their hearts. Eliane could so easily have been convinced by the words meant to put her down, but instead, each obstacle was just another step to bring her higher. That is a strength of spirit that cannot be taught...and just like the lessons learned in life, it cannot be taken away. Way to go, Eliane!
História muita bonita e os cometários pertinentes.
Eliane fez a melhor escolha, e deixa e nos ensina
muitas coisas importantes. Uma vida e muitos caminhos.
Ninguém a esse mundo por acaso. Felicidades, Eliane!
História inspiradora. Parabéns Eliane!
Troucou a oportunidade de dar o troco pela generosidade.
Tem que ser forte!
História bonita!
Que texto lindo e emocionante! Parabéns!
Abraços,
Diana Scarpine.
Não se deixar prender à mágoas. Não sentar em cima de seus pesares.
Andar sempre para frente. Essa foi a atitude de Eliane.
Eu diria o que a avó de Clara disse: Eliane você é uma pessoa de valor!
Obrigado pela bonita história, Cinco Cantos. Mando meu amor a vocês.
É maravilhosa a superação de Eliane através da oportunidade que lhe foi dada. Uma garota cheia de valores, com um coração grato e a capacidade de valorizar uma amizade e por ela perdoar. A força de seguir sempre sem se lamentar. Tudo isso nos prende à essa história tão bonita e tão bem contada. Parabéns ao Blog! Abraços
Cinco Cantos agradece a visita e as opiniões de Lea, Vida, Tobias, Dinah, Eduardo, Fátima, Mantoliva, Alex, Cecilia, Rochela, Ione, Diana, Navena e Steven.
Uma historia de superação, amor e perdão de Eliane, um exemplo inspirador a ser seguido.
Lembramos que as histórias são reais e em breve teremos nova.
Cinco Cantos thanks Lea, Vida, Tobias, Dinah, Eduardo, Fátima, Mantoliva, Alex, Cecilia, Rochela, Ione, Diana, Navena and Steven for the visit and opinions.
A story of overcoming, love and forgiveness by Eliane; an inspiring example to be followed.
We remind you that the stories are real and soon we will have a new one.
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