José, um português bonitão, nascido em Trás os Montes, era ainda solteiro nos seus quarenta anos.
Sua paixão era a família, em especial sua mãezinha,
como a chamava.
Se preocupava em dar o melhor aos seus três irmãos, um
tanto quanto indolentes, acostumados a receber as benesses providas pelo irmão
mais velho.
José, cuidadoso como era, via sua casa precisando de
reparos e os irmãos se lamentando por não terem estudado devido a falta de
recursos.
Ele não queria isso para seus sobrinhos, já que filhos
não tinha.
Resolveu dar um passo profissional mais largo,
ganhando muito melhor, embora o novo trabalho exigisse o sacrifício de ficar mais tempo em mar do que em
terra.
Aceitou a oferta. Viajaria pelo mundo e nos três meses
em que estivesse em terra ficaria com a família.
Passados alguns anos, conheceu e se envolveu com Mara,
uma enfermeira divorciada e com um filho que morava com o pai.
O romance dos dois evoluiu e resolveram morar juntos
casando algum tempo depois.
Dividia agora o tempo em terra com a mulher em outro
país e sua familia em Portugal.
Algumas vezes viajavam juntos, para visitarem a
familia dele.
Em uma dessas viagens a Portugal, José recebeu a
visita de um rapaz, dizendo-se seu filho, nascido nos tempos de namoro livre,
um fato desconhecido por ele até então.
A conexão entre os dois foi difícil, o rapaz tinha
modos que José não aprovava.
Não aceitava conselhos, apenas a ajuda financeira que
passou a receber do pai.
Agora com um filho e sobrinhos crescendo, José começou
a investir em sua terra, para dar melhor condição de vida no futuro à família e
a ele mesmo.
Um de seus irmãos era seu procurador e administrador.
Mas não desenvolvia bem a função, não conseguindo
manter os recursos enviados por José.
Começaram os conflitos em família.
José tinha medo da velhice mas, apesar disso, era gastador e muito generoso com os outros e com a
família da mulher, motivo para guardar dinheiro longe dele.
Nomeou seu sobrinho como seu novo procurador.
Procurava orientar o sobrinho por quem nutria um amor
de pai, mesmo sem conviver muito com ele.
Confiava totalmente nele, e por essa preferência, as
brigas com o filho ficaram mais constantes.
− Precisas tomar jeito, ó pá! Como vou confiar em ti
com tua vida torta? Pensas que não sei que és um drogado e gastas tudo que te
mando com as prostitutas?
− Onde tu inventaste essa história? − Respondia o
filho.
− Não interessa. Importa que sei.
E assim seguiam sem um contato cordial ou mais
próximo.
Com a perda de sua mãe, José diminuiu suas visitas a Portugal,
passando seu tempo em terra no país de sua mulher.
Criou amizades, fez boa vizinhança e ajudava a muitos.
Nunca negou-se estender a mão a quem lhe pedia ajuda.
Era querido e respeitado.
Agora, estabilizado em terra firme, podia fazer o que
tanto gostava: ter seus cães para cuidar. Chegou a cuidar de dezoito cães em
casa, eram seus filhos, dizia.
Era feliz; mas a convivência diária com a esposa não
ía muito bem.
Já com mais idade, se irritava facilmente e isso
se chocou com a extrema sensibilidade de Mara, sua mulher.
As brigas eram constantes e ele não economizava as
grosserias.
− Vamos conversar, José. Desse jeito não estou feliz –
dizia Mara.
− Ah, não? E por que não vais embora?
− Porque quero manter meu casamento e acho que se você
quiser nós podemos viver bem.
− Estou é muito cansado de tanto choramingares. Já me
chega ter passado metade da vida com os peixes.
A cada briga era o mesmo.
Até que um dia ela aceitou a sugestão de ir embora e
foi, para surpresa dele.
Vendo o carro de mudança em frente à casa, se
assustou.
− Espera, onde pensas que vais?
− Estou indo embora como você vem sugerindo. Resolvi
seguir seu conselho. Adeus! – Despediu-se ela sem muitas “choramingas.”
Inconformado, José tentou impedir. Ela não
aceitou.
Mara seguiu sua vida deixando-o para trás.
Ele ainda a procurou muitas vezes tentando uma
reconciliação.
Dizia que o trabalho duro por tantos anos dentro de um
navio, o tinha deixado assim, nervoso e agitado.
Não convenceu Mara. Concordou então em serem amigos e
aceitar uma separação amigável.
Acreditava de certa forma, que com o tempo a
convenceria a mudar de ideia.
Isso não aconteceu e ele conformou-se.
Ficou sozinho com seus cães, mas não por muito tempo.
Reencontrou uma amiga a qual tinha ajudado no
passado.
Estreitaram a amizade, ficando ela ao seu lado, o
ajudando e sendo ajudada. Uma troca justa.
Os anos correram rápidos, como corre para todos
nós.
A idade chegando e junto com ela as doenças naturais da velhice.
José precisava de mais conforto e um atendimento médico
melhor.
Acreditava não ser isso um problema, tinha seus
investimentos em Portugal, pediria ao sobrinho que lhe providenciasse as
remessas, uma vez que o dinheiro que tinha com ele havia acabado.
− Como estás, ó rapaz?
− Muito bem, amado tio!
− Escuta aqui ó rapaz, preciso que me mandes meu
dinheiro para cá.
Estou mal das pernas e preciso disso.
− Mandarei meu tio. Só preciso de uns dias para
retirar das aplicações.
O tempo foi passando e o caro sobrinho já não atendia
mais suas ligações.
José, a cada dia ficava mais debilitado e incapaz de reconhecer alguém.
Vivendo apenas de sua pequena aposentadoria, começou a
depender dos favores que plantou. Dos amigos que fez.
Embora não tenha ideia do que se passa ao seu redor,
recebe o essencial para que sua vida não termine sem dignidade.
De tudo que viveu, não teve tempo de aprender muito
com ela. Mas nos deixará uma grande lição:
Muitas vezes o erro está em nossas escolhas, na crença
exagerada nas pessoas erradas, de que temos o controle de tudo e que somos eternos.
Aprendemos também, que uma semente plantada em terra
fértil, um dia nos dará os frutos que matam nossa fome.
“Essa história é uma homenagem em vida a um amigo que
muito plantou em nosso terreno.
Porque entendemos que depois que partirmos da terra, a
melhor homenagem é a oração.”
E você, acredita que a semente que plantamos pode
brotar um dia?
14 comentários:
Com certeza!
A prova disso é a história desse homem que semeou lá no passado e hoje colhe seus frutos.
Realmente, uma história que vemos todos dias. Uma história de muita sensiblidade. Que não esconde as falhas e as virtudes de um ser humano
comum e seu erro maior: acreditar nas pessoas erradas.
Mas também a sorte de plantar em terra boa.
Infelizmente, as vezes plantamos sobre predras.
Boa sorte, Seu José!
A história do seu Zé é a história de muita gente simples que não vê maldade nas pessoas mais próximas !!
Eu acredito mas concordo com a opnião de unknown que a história de Seu José é a de muitas pessoas de boa fé. Os espertos se aproveitam e nem sentem remorso. Ainda bem que ele encontrou gente digna.
Ah, seu José, como já dito nos comentários anteriores sua boa fé foi explorada por pessoas de má fé.
Por outro lado, seu comportamento, sua simpatia e ajuda aos amigos, mostrou que o que se planta, se colhe.
Muitas vezes em lugares onde não achamos que irá brotar.
Bonita história e muito comum desde que o mundo é mundo.
Parabéns ao blog.
Seu José ainda bem que o senhor plantou em terra boa, recuperando
o que lhe foi tirado com sua boa credibilidade.
Fique triste não, Seu José, o senhor deixou uma grande lição.
Que seus dias sejam bons! Boa sorte!
Confiar na nos mais próximos, como família, as vezes nos da a falsa ilusão
de que estamos protegidos. Seu José ganhou mais ajudando os desconhecidos.
Desejo que tudo essa família se arrependa.
Gostei muito, o desfecho é tocante e muitíssimo bem escrito.
Parabéns !!!
Seu Jose uma dessas pessoas que ainda acredita que basta ter o mesmo sangue para ter o mesmo caráter. Hoje é agraciado pela própria generosidade que lhe vem de volta. Histórias assim nos faz pensar e nos emocionar. Que ele possa ter uma partida digna como foi sua vida.
Mando meu amor ao pessoal do blog que gentilmente compartilha lições
como esta.
Seu José uma história que me comoveu, não só pela sua história,
mas por conhecer um caso muito proximo. Feliz os plantam em terra fértil
e seu José plantou. Pobre daquele que não encontram uma terra boa.
Desejo muita sorte ao seu José e benççaos aos que estão ao seu lado.
Obrigado ao pessoal do blog por nos trazer sempre uma lição de vida.
Seu josé é uma dessas lições que marcam e nos emocionam.
A boa vontade sempre é recompensada, pelo menos em minha opinião que
acredito na continuação da vida em outra dimensão.
Portanto, acredito que a semente plantada pode brotar um dia.
Abraços a todos!
Fiquei bem triste com a história de Seu José. A gente sempre acredita que a família é o lugar mais seguro. Mas fiquei feliz tambem que os amigos apareceram na hora que ele mais precisava. Tudo de bom para Seu José.
Cinco Cantos agradece a visita e opinião de Vida, Lea, desconhecido(a), Rochela, Eduardo, Cecília, Pauline, Elke, Navena, Cida, Steven e Renata.
Nós também acreditamos que as boas sementes, em boas terras, frutificarão, assim como está acontecendo com Seu José, que se por um lado teve dissabores vindos de seus familiares, por outro recebeu as bênçãos plantadas com os amigos.
Agradecemos a todos e lembramos que as historias são reais.
Em breve nova historia.
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