Enquanto a Cegonha
não Vem...
Quando chegamos ao mundo, aterrissamos no desconhecido. Resta torcer para que essa aterrissagem seja dentro de um coração.
O ideal da vida seria passarmos por todas as etapas que nos levassem ao
amadurecimento naturalmente, sem sofrimento nem dores.
Mas, nem sempre é a vida que dita as regras do jogo, nós nos
encarregamos de ultrapassar a linha e ditamos as regras sem calcular o preço.
Na fase criança, fazemos isso sempre, mas temos a sorte de sermos apenas
criança e termos por perto alguém para nos segurar.
Na fase adolescente, pensamos ser donos do mundo. Acreditamos que nada
vai acontecer além daquilo que queremos.
Em nossa visão, nossos pais
envelhecem repentinamente e já não sabem o que é melhor para nós. Afinal, temos
o dominínio de nossas vidas e somos as pesssoas mais inteligentes do mundo. Imortais até.
Era exatamente assim o pensamento de Nicole, nos seus 17 anos de idade.
Morava com sua mãe e padrasto. Achava que ele, embora a criasse como a
uma filha, não tinha o direito de lhe exigir nenhuma obediência.
Passava longe a vontade em obedecê-lo. Isso custava grandes brigas em
casa.
Defendia suas péssimas escolhas de amizades com todas as forças, e não
ouvia a ninguém, nem dava atenção aos alertas que os pais lhe davam.
Fugir da escola para namorar escondido era uma aventura maravilhosa. Se
sentia a pessoa mais esperta do mundo.
Se apaixonava muito facilmente. Entre uma e outra paixão, chorava e
sofria, sempre culpando o destino. Mas logo se recompunha e lá estava ela, amando
para sempre.
A luta de sua mãe e padrasto para que ela terminasse a escola era
gigante, mesmo assim não terminou.
Jurava que as faltas não a prejudicavam, afinal de contas, era
suficientemente inteligente para aprender sem se esforçar.
Conhecia tudo de celular e computador, só não percebia o quanto sua
escrita denunciava sua fuga das aulas.
Namorou um garoto envolvido com drogas, e ousou ajudá-lo, enfrentando o
padrasto e a mãe. Um tormento superado a alto custo.
− Nicole, minha filha, veja bem: eu já não tenho como
te defender. Você quer acabar com o meu casamento? Você não me ouve, não ouve
ao seu pai...
− Que inferno!
Ele não é meu pai e você quer que eu viva como uma velha dentro de casa.
Esqueça! De jeito nenhum vou ficar trancada.
− Escute aqui
garota! – Interrompeu Seu Olavo − Já chega, entendeu? Você ainda é menor de
idade mas mesmo assim, se quiser morar aqui é dentro de nossas regras. Se não
quiser, procure sua turma e suma!
Sumiu.
Saiu de casa sem
se importar com nada. Não precisava deles. Tinha amigos, um novo namorado... estava tudo certo!
Agora seria livre, faria tudo o que quisesse. Escolha que não foi
positiva por muito tempo.
Tentou trabalhar e conseguiu apenas serviços esporádicos. Não parava em
lugar nenhum. Era rebelde, mesmo precisando do emprego.
Sobraram então os amigos com a mesma capacidade e que dependiam de suas
famílias. As amizades foram cortadas, ficaram poucas, bem poucas.
Restou o novo namorado mais imaturo do que ela. Tinha somente o conforto
da companhia dele em lugares incertos. Tinha os beijos, os carinhos, o sexo
alimentado pela força dos hormônios inerentes aos adolescentes.
A euforia passou logo. Os dois queriam novas aventuras. O
garoto explicou que o “amor” acabou. Nicole aceitou sem drama e logo buscaria
uma nova paixão.
Tentou encontrar alguém, mas lhe faltava ânimo. Estava muito envolvida
com enjôos e outros efeitos de uma gravidez surpresa.
Procurou a mãe e contou a novidade, pedindo para voltar. A mãe falou com
o marido que não a aceitou de volta, ainda triste pela maneira como ela saiu e todo
transtorno que havia provocado.
− Nem se Nossa Senhora pedir! – Disse Seu Olavo.
Não adiantaram os argumentos da mãe de Nicole.
– Não. Não e não! PONTO! – Decretou, para angustia da mãe e indiferença de
Nicole.
− Ih, mãe, esquenta não. Vou trabalhar, ter meu bebê e
muita gente vai me ajudar. Vida que segue!
Só não contava que entraria para a escola da vida muito cedo, uma escola
que a ensinaria muito e de onde não tem como fugir.
Muitas pessoas disseram para ela não ter o bebê, ou doar para uma
família que pudesse criar com carinho.
Resolveu ter o bebê e aprender todas as lições sozinha, já que não sabia
muito sobre o garoto, pai de seu filho. Nem seu nome completo ou endereço.
Esperava o filho com a mesma alegria que esperava pela boneca nova, no tempo -
não muito longe - em que ainda brincava com elas.
Não sabia exatamente como seria de verdade. Mas acreditava que seria
fácil, e em sua cabeça adolescente, venceria todas as dificuldades.
Primeira lição: na vida real, a gente precisa comer, beber e ter um lugar para dormir.
Segunda lição: dinheiro não cai do céu e não nasce em árvore.
Terceira lição: nem tudo é fácil como parece e “as muita gente” que se conta, na
verdade nunca aparecem.
Essas três lições a fizeram crescer num passe de mágica.
A cada dia dormia em um lugar diferente, e os trabalhos, sempre pesados,
eram suficientes apenas para garantir o pão nosso de cada dia.
Passeava nas lojas de roupas de criança e sonhava com tudo aquilo para
seu bebê. A frustração a fez enxergar o quanto foi tola em acreditar em seus
super poderes.
Procurou pessoas da família, que sem muita delicadeza lhe fechavam as
portas.
Depois de dormir na varanda da casa de uma tia que lhe negou abrigo,
lembrou de uma amiga dessa mesma tia, que conheceu quando era bem-vinda por lá.
Era uma pessoa boa, com filhos criados e seu marido era uma pessoa boa também, talvez a
ajudasse, pensou.
Arriscou um contacto com ela. Contou sua história sem negar suas falhas.
Dona Cida, que já conhecia um pouco a Nicole, foi conquistada pela
franqueza da garota e por lembrar que havia sido mãe adolescente também. Sentiu
empatia por ela e se arriscou.
Conhecia a fama da garota através da amiga e mesmo assim lhe deu
atenção.
Conversaram muito e sentiu o quanto a garota era despreparada, e decidiu
ajudá-la, avisando no entanto, quais seriam as normas. A menina aceitou.
Nicole acatou os conselhos de Dona Cida e reconheceu que errou. Entendeu
que hulmildade é uma grande aliada quando se foi derrubado pela própria
arrogância.
Tinha poucos meses para se por de pé, com apenas um suporte oferecido
pela nova amiga.
Juntas, começaram a procurar uma saída de trabalho, de sobrevivência
para ela e seu bebê.
Dona Cida teve uma idéia que poderia ajudar, mas dependia de disposição
e de muito trabalho por parte de Nicole. Porém, avisou que “não lhe daria o
peixe (...)”
Nicole era vaidosa e bonita, gostava de se maquiar. Dona Cida
sugeriu que fizesse um curso de
maquiagem, a fim de se profissionalizar nessa área.
Assim, com a ajuda que receberia do governo, alugaria um espaço para
morar e atender uma futura clientela.
Para pagar o curso e o primeiro mês de aluguel de uma quitinete, Dona
Cida lhe ajudou. Mas sabia que abrir totalmente a mão nesse momento poderia
levar Nicole ao comodismo. Deixou claro que seria uma ajuda única, um empurrão
para um começo.
Nicole trabalhava à noite como garçonete em um pequeno restaurante e
fazia o curso durante o dia.
Ganhava pouco, mas isso lhe ensinou a economizar e administrar seu
dinheiro. Agora sabia quanto valia cada centavo.
Estava tão bem no curso de maquiagem, que os colegas e professores a
incentivaram a mostrar seu trabalho na Internet.
Trabalhando em casa, ela mesma cuidaria de seu bebê, o que seria uma boa economia e uma grande vantagem. Sabia que levaria anos para conquistar
seguidores, mas, era uma tentiva.
Seu bebê, um menino, estava quase chegando. Dona Cida organizou um chá
de “Mamãe e Bebê.”
Para o Bebê, fraldas, e a para a mamãe, produtos de maquiagem.
Ela e seu marido, presentiaram Nicole com um celular novo. Do aparelho
velho, ela fez uma rifa e faturou mais do que o celular valia.
Estava confiante e bem mais consciente dos desafios que viriam pela
frente.
A mãe e o padrasto, anonimamente, mandaram presentes para o bebê e algum
dinheiro. Tinham medo de estragar aquela mudança. Esperariam mais tempo para
participar dessa nova etapa.
Deus se fez presente na aterrissagem de Mateus. Não foi fácil sua
chegada, o que despertou em Nicole sua espiritualidade e fé.
Começava alí, a vida real de Nicole e Mateus, que a ensinou o que é amar
de verdade. Amor inteiro. Sem volta.
Namorar? Diz não ter pressa, precisa amadurecer mais e ter mais
segurança. Dona Cida continua os conselhos e os puxões de orelha.
As duas tem uma relação de respeito e carinho.
Nicole está seguindo a cartilha da batalha, pondo em prática tudo que
tem aprendido e sabe que ainda tem muito a aprender.
Agora, aos vinte e quatro anos, a vida só está começando. Traz junto muitas
lições e novos desafios. Sabe bem a diferença de um bebê real e uma boneca.
Qualquer dia, quando estiver pronta, Nicole quer mostrar sua história em
seu canal de trabalho, para que outras meninas que a acompanham, entendam que a
vida só é cor-de-rosa para quem sabe pintar.
“Um
brinde ao inesperado. E às diversas formas de seguir em frente!”
12 comentários:
A história da Nicole é bem realista. Acontece com muitas adolescentes que acham-se sábias e não ouvem conselhos dos seus pais.
O amor de Deus é constante e real, apesar dos erros do ser humano, Ele sempre providência anjos para nos socorrer! A Dona Cida foi o anjo, o instrumento de Deus para ajudar, orientar e corrigir, que a Nicole aceitou e pode recomeçar a vida de forma correta.
Uma historia bem realista. Alguém já disse que na vida se aprende vivendo. A relação entre Dona Cida e Nicole é muito bonita.
Parabéns ao pessoal do blog por mais uma história muito bonita.
Gostei muito da história. O conto d vocês contém sempre uma
lição de vida. Parabéns!
Infelizmente é assim, os filhos nem bem crescem e acham que sabem tudo,
dominam tudo. Pena que nem sempre se tem uma dona Cida por perto. Nicole
teve sorte e se dobrou.
Best of luck to Nicole. Some lessons are harder than others, but acknowledging our own faults and working to overcome is the first true step to a better life.
Mais uma história para refletir.
A pessoa quando quer mudar e tem a uma mentoria ( a Cida fez essa função) faz toda a diferença na minha vida do sujeito.
Uma quis ajudar, a outra quis ser ajudada. União de queres deu um rumo a essa história que poderia terminar como muitas outras que se perdem no caminho.
Sorte das duas, Dona Cida e Nicole, que fizeram acontecer.
** Corrigindo: União de quereres - quis dizer
Eu fui uma adolescente mais ou menos igual a Nicole. Não tive a sorte dela
de enxergar meu erro logo. Demorei a aprender e sofri bastante.
Uma história que ensina muito. Boa sorte para essa garota!
Linda história! Cheia de ensinamentos!
Parabéns!
Abraço,
Diana Scarpine
Postar um comentário